domingo, 27 de abril de 2014

Jogo da Vida

(Sobre)Viver só porque o coração bate
É jogar em contra-ataque
Com Deus à defesa
Que ganha sem surpresa...

É correr só para não oferecer resistência
Contra o sentido da existência
Que Deus define como liberdade
De sentir a felicidade.

Existir implica sofrer
O facto de quase não ser...
Mais que um jogador a perder
Na vida que joga a correr...

Não sei se sou...
O que Deus sonhou...
Sei que jogo o jogo da Vida
Às vezes tão (mal) sentida...







Ni

sábado, 19 de abril de 2014

... Eras Tu

Foi estranho... Fiquei a pensar... Depois senti e sorri...
O meu coração batia, rítmico, mas em taquicardia. Revi mentalmente as causas de palpitações e nada... Eras Tu.
Os olhos desfocaram e embaciaram de repente. Recapitulei causas de visão turva e alterações súbitas de visão e nada... Eras Tu.
Arrepiei, sem ser por frio, febre ou outra qualquer coisa que entendesse de princípio... Eras Tu.
Ajoelhei-me e sem qualquer dor ou contratura muscular não podia levantar-me. As pernas tremiam, a alma baloiçava calma, o coração rezava. A minha pequenez era agora maior... Eras Tu. Naquela cruz... Tu.
Suspirei. Agradeci a Vida...
Amanhã será diferente... Contigo tão igual...
Em tudo... Em mim... Eras Tu.






Ni

terça-feira, 15 de abril de 2014

Porquê?!


Porque é que é tão diferente
Este amor que sozinho sente
Que por tudo existe,
Que por nada persiste...,
Que numa louca realidade vive
E que num sonho tão (ir)real sobrevive?

Porque é que acontece assim
Com início e sem fim...,
Com a vida a passar,
Com uma história por contar...,
Sem sequer ter a decência de pedir
Para entrar, ficar e fazer sentir...?

Para quê perguntar
A razão de amar,
Se não existe razão
A coabitar o coração
Onde sinto amor sem fim
A roubar-me a razão que há em mim?






Ni

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Sapatilhas com luz...

Acabava o dia de trabalho. O elevador desceu do 10 ao zero, com 8 paragens pelo meio. As conversas do elevador raramente me interessam e têm tendencialmente a capacidade de me chatear. Liguei o meu iPod, o NiPod. No zero, entre os pés inquietos, as bengalas e muletas a tentar entrar no elevador sem deixarem sair quem lá estava, vi umas sapatilhas, pequeninas, cor-de-rosa e com brilhantes, paradas. Estavam sozinhas naquela fila de cadeiras, que por sinal foi sempre a fila que escolhi quando entrei na capela.
Fui ver. Desligo o NiPod... Era uma menina, vestida toda a condizer com as sapatilhas (incluindo a mochila...), com os cabelos cor de ouro e uns olhos de fazer inveja ao mar.
Olhou-me com esperança, mas corrigiu depressa... e disse baixinho e triste: "Achei que era o meu pai...".
Perguntei-lhe se estava sozinha e se precisava de alguma coisa...
"O meu pai mandou-me esperar aqui... Ele foi ver a minha mãe. Eu queria ir, mas ele não me deixa."
A conversa fica logo difícil.
Tento mudar, pelo menos o tom: "Se quiseres, posso fazer companhia a uma menina tão bonita como tu..."
- "Também tens que esperar por alguém?"
Disse-lhe que não, que trabalhava ali, que estava de saída quando vi umas sapatilhas tão giras que só podiam ser de uma menina também muito gira.
A luz daqueles olhinhos voltou a brilhar mais: "Trabalhas aqui? Então conheces a minha mãe... Ela é assim bonita como eu... Sabes quem é?"
Com muito jeitinho, tentei dizer-lhe que não... "é que aqui está muita gente, não conseguimos conhecer todos..."
- "Mas, olha, ela é assim... como eu... Eu queria vê-la e o meu pai não me deixa..." Pára um pouco, muito pouco... e continua com uma naturalidade que dói... "Eu acho que ela vai morrer e queria vê-la e dizer-lhe que gosto muito dela e... que me tenho portado bem!"
Expliquei, como quem esfarrapadamente arranja desculpas: "Aqui é o hospital dos adultos... e não deixam entrar crianças."
Perguntou, sem disfarçar a tristeza e a indignação: "E como é que eu faço para dizer estas coisas à minha mãe?"
"Podes escrever... Queres? Se quiseres eu ajudo-te..."
"Oh... Mas também não posso entregar..."
Sugeri que entregasse a alguém que fosse visitar a mãe..., mas ela continuou "o meu pai ia ler e chorar... e eu não quero!"
Estava complicado. Só vi uma salvação. Rezei para que corresse bem. "Sabes quem é Jesus?"
Com o dedo tão decidido quanto ela, apontou (não sei para onde, que não tirei os olhos dela...): "É Ele."
Não sei se suspirei, mas respirei de alívio. "Eu acho que Ele consegue ler o que tu escreveres e que diz à tua mãe... Não achas?!"
Tirou o estojo cor-de-rosa da mochila, escolheu criteriosamente a caneta e, numa folha de um caderno exemplar começou a escrever:
"Querida mãe, eu gosto muito de ti e tenho-me portado bem...
O pai anda triste porque acha que tu vais morrer..."
Não eram muito mais as palavras, mas, confesso, já não consegui ler todas...
Acabava com "um beijinho para a minha mãe. Gosto muito de ti."
Arrumou tudo e disse: "Eu também acho que Ele consegue ler..."
Ficámos mais um pouco a falar de sapatilhas com luz...






Ni